Márcia Brandão - Psicopedagoga

Por Márcia Brandão
www.instagram.com/marciabrandao.psicopedagoga/

23 de março de 2013

Apenas brincando



"Quando eu estiver a construir um edifício de blocos, por favor, não digas que eu "estou apenas brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco; sobre equilíbrio e forma. Algum dia eu posso ser um arquiteto.

Quando eu estiver bem vestido, a pôr a mesa, a cuidar do bebê, não tenhas a ideia de que eu "estou apenas brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Algum dia eu posso ser uma mãe ou um pai.

Quando me vires pintado até os cotovelos, a construir uma moldura, ou a moldar e a dar forma à argila, por favor, não me deixes ouvir-te dizer que eu "estou apenas brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Eu estou a expressar-me e a ser criativo. Algum dia eu posso ser um artista ou um inventor.

Quando me vires sentado numa cadeira a "ler" para uma audiência imaginária, por favor, não rias e não penses que eu "estou apenas brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Algum dia eu posso ser um professor.

Quando me vires a apanhar insetos ou a guardar as coisas que encontro no bolso, não os jogue fora como se eu "estivesse apenas brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Algum dia eu posso ser um cientista.

Quando me vires montando um quebra-cabeça, por favor, não penses que estou a desperdiçar tempo "brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Estou a aprender a concentrar-me e a resolver problemas. Algum dia eu posso ser um empresário.

Quando me vires a cozinhar ou provar comidas, por favor, não penses que estou "só a brincar". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Eu estou a aprender sobre os sentidos e as diferenças. Algum dia eu posso ser um cozinheiro.

Quando me vires a saltar, pular, correr e mover o meu corpo, por favor, não digas que eu "estou apenas brincando". Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Eu estou a aprender a conhecer melhor o meu corpo. Algum dia eu posso ser um médico, um enfermeiro ou um atleta.

Quando me perguntares o que fiz na escola hoje, e eu responder: "eu brinquei". Por favor, não me entendas mal. Já que, entenda, eu estou a aprender enquanto brinco. Eu estou a aprender a apreciar e ser bem sucedido no trabalho. Eu estou a preparar-me para o amanhã."


Hoje, eu sou uma criança e meu trabalho é brincar.

- Anita Wadley, 1979

10 de março de 2013

A Psicopedagogia e a criança com necessidades especiais


[...]

Para a Psicopedagogia, o fato de uma criança ser portadora de disfunções ou transtornos específicos, não constitui por si só um problema de aprendizagem pois sempre há um potencial a ser aprendido e aspectos a serem desenvolvidos. 

O que ocorre, entretanto na maioria das vezes é que sua questão específica pode ser um terreno fértil para a instalação de obstáculo ao processo de aprender da criança, pois, muitas vezes ao seu déficit específico vem se juntar o não reconhecimento da dificuldade por parte família e/ou pelo próprio portador. Por outro lado, exigências do contexto social e escolar que não levem em conta sua especificidade, podem criar dificuldades tamanhas, que a criança pode vir a ter diminuída a capacidade de desenvolver seu potencial de aprendizagem, não atingido por determinado transtorno.

Para Paín, uma criança com um antecedente de cianose no parto, leve imaturidade perceptivo-motora, certa rigidez nos traços, não cria por isso um problema de aprendizagem, desde que sua personalidade lhe permita assumir dificuldades, desde que os métodos tenham-se ajustado às deficiências para compensá-las e desde que as exigências do ambiente não tenham colocado ênfase justamente no aspecto danificado- prestigiando a caligrafia, por exemplo-. Mas se somamos ao pequeno problema neurológico uma mãe que não tolera o crescimento do filho e uma escola que não admite a dificuldade, cria-se um problema de coexistências que parcialmente poderiam ter sido compensadas.

As recentes descobertas científicas sobre a plasticidade cerebral reforçam essa posição sobre o processo de aprendizagem e as inúmeras possibilidades do ser.

Assim posto, a avaliação e o atendimento psicopedagógico de crianças com dificuldades especiais, têm por fim conhecer aquele sujeito frente ao ato de aprender, de que potenciais lança mão, que potenciais paralisa, quais obstáculos, medos, sentimentos de potência e impotência surgem frente à aprendizagem. Propiciar, no atendimento, situações que o conduzam a pensar, refletir, organizar, enfrentar, superar-se, mobilizando objetivamente e subjetivamente seu potencial, não ignorando seu limite, nem paralisando frente a ele, constitui uma proposta psicopedagógica para o atendimento de qualquer criança com obstáculos à aprendizagem e não é diferente com as crianças com questões impeditivas específicas ao seu desenvolvimento.

Cabe ressaltar a necessidade de um diagnóstico diferencial, que vise identificar os transtornos específicos, diagnóstico esse pertencente a profissionais de diferentes áreas de saber, inseridos como diagnósticos complementares à avaliação psicopedagógica. 

As vantagens desses diagnósticos, sob o ponto de vista psicopedagógico, seria de se trabalhar com o sujeito real, objetiva e subjetivamente, reconstruindo sua identidade de aprendiz, podendo focar o atendimento nas possibilidades de aprender, mediando a relação do sujeito com o saber, a partir do acolhimento do sujeito como unidade dentro da diferença. 

O risco de diagnóstico etiológico para o terapeuta seria o de suprimir o sujeito, transformando-o, identificando-o, nomeando-o pela doença, através de números, siglas ou problemas, negando sua subjetividade, sua possibilidade como ser uno. Por outro lado, se pretender negar causas orgânicas, estruturais, corre-se o mesmo risco de se negar o sujeito.

Para o psicopedagogo, o ser que se apresenta tem sempre algo a aprender, algo a trocar, um caminho de aprendizagem a percorrer.

Referência Bibliográfica
ZENICOLA, Ana Maria. Psicopedagogia e Reabilitação. 2007. Disponível em: <http://www.psicopedagogiaempauta.com/A07_PsicoReabili_Zenicola.pdf>.