
(...) Para Piaget, no estágio das operações formais, mais ou menos dos 12 anos em diante, ocorre o desenvolvimento das operações de raciocínio abstrato. A criança se liberta inteiramente do objeto, inclusive o representado, operando agora com a forma (em contraposição a conteúdo), situando o real em um conjunto de transformações. A grande novidade do nível das operações formais é que o sujeito torna-se capaz de raciocinar corretamente sobre proposições em que não acredita, ou que ainda não acredita, que ainda considera puras hipóteses. É capaz de inferir as conseqüências. Têm início os processos de pensamento hipotético-dedutivos. Os que tiveram a experiência de apaixonar-se pela primeira vez na vida, isto foi um momento adolescente em que as operações formais piagetianas foram experimentadas com toda intensidade, principalmente contrastando com o período cognitivo anterior de pensamento concreto. Esta é mais uma das mudanças significativas neste momento da vida.
Pensando, o desenvolvimento humano metaforicamente como um leque, como referimos anteriormente, no momento adolescente o indivíduo, depois de ter nascido num meio familiar, estar inserido numa realidade escolar, abre-se finalmente para sociedade e cultura onde estiver inserido.
Atualmente, vivemos um período onde a sociedade e a cultura sofrem intensas mudanças e transformações de paradigmas e valores que incidem poderosamente na existência dos adolescentes. A atualidade e suas complexidades incrementam ainda mais este período evolutivo chamado adolescência, no qual transformações bio-psico-sociais acontecem, pois determina um momento de passagem do conhecido mundo da infância ao tão desejado e temido mundo adulto.
As transformações da adolescência ocasionam flutuações que se caracterizam por momentos progressivos - onde predomina, entre outros aspectos, o processo secundário, o pensamento abstrato e a comunicação verbal - e momentos regressivos - com a emergência do processo primário, da concretização defensiva do pensamento e a retomada de níveis não verbais de comunicação.
Com relação ao aspecto da sexualidade na adolescência temos de pensar a partir da puberdade (modificações biológicas) e da mudanças psico-sócio-culturais que estão implicadas no processo adolescente. Puberdade é um processo biológico que inicia-se em torno dos 9 anos e estende-se até em torno dos 14 anos. Como fenômeno orgânico de maciço desenvolvimento hormonal é o que origina os chamados "caracteres sexuais secundários". Percebemos que o adolescente, após isto, já estaria maduro organicamente para exercer sua genitalidade, porém cabe pensar neste momento se estaria "pronto" para viver a plenitude de sua sexualidade... Sabemos que genitalidade e sexualidade não são sinônimos, ou seja, a primeira significa o ato puro de uma relação sexual, enquanto que a segundo é muito mais abrangente, englobando além do ato da relação sexual também todo o envolvimento afetivo necessário para a completude de uma relação amorosa. Genitalidade está entre as pernas, sexualidade está entre as orelhas.
A identidade sexual, que começa a se organizar desde o nascimento, adquire sua estrutura, seu perfil definitivo, na adolescência. É nesta etapa da vida que ocorre a passagem da bissexualidade básica (infantil) para a heterosexualidade (adulta). Este processo integra a vivência do individuo de maneira muito significativa tanto em termos externos (sociais, culturais) como internos (pessoais, afetivos).
A adolescência é caracterizada por inúmeros elementos, dos quais podemos referir alguns: a perda do corpo infantil, dos pais da infância e da identidade infantil; a passagem do mundo endogâmico ao universo exogâmico; a construção de novas identificações assim como de desidentificações; a reorganização de novas estruturas e estados de mente; a aquisição de novos níveis operacionais de pensamento (do concreto ao abstrato) e de novos níveis de comunicação (do não verbal ao verbal); a apropriação do novo corpo; vivência de uma nova etapa do processo de separação-individuação; a construção de novos vínculos com os pais, caracterizados por menor dependência e idealização; a primazia da zona erótica genital; a busca de um "objeto" amoroso; a definição da escolha profissional; enfim, de muitos outros aspectos que seria possível seguir citando, mas, em síntese, referem-se a organização da identidade em seus aspectos sociais, temporais e espaciais. Se pudéssemos resumir muito sucintamente o período adolescente, diríamos uma palavra - identidade.
Adolescência é um momento de vida caracterizado por uma busca constante de diferenciação, discriminação e consecução de uma identidade. Deve ser vivenciado com "flexibilidade", ou seja, o ambiente que tem um adolescente no convívio deve permitir esta experiência vital de forma flexível, que não significa nem permissividade muito menos repressividade. É poder dar-se conta que na família que tem adolescentes toda a família adolesce. Superar este momento para conquistar amadurecimento é o desafio.
É importante salientar que nossos atos precisam significados, precisam ser simbolizados para podermos nos conectar com a dimensão subjetiva das relações que estabelecemos com os outros (nossos semelhantes), senão nos tornaremos vazios, desamparados e tristes.
Uma vez ouvi que: "Aos filhos devemos dar raízes e asas". Embora seja uma metáfora um pouco incoerente, ela se presta muito para pensarmos a tarefa de cuidar de uma criança ou adolescente. Raízes seriam de onde vão nutrir-se e sempre terão para onde voltar. Asas para alçarem vôos, inclusive mais altos que os pais. Se dermos muitas raízes, ficarão dependentes, não irão muito longe. Se dermos muitas asas, poderão perder-se ou andar sem rumo, sem sentido. No processo do desenvolvimento humano, para que crianças e adolescentes desenvolvam-se saudavelmente é necessário proteção e segurança por parte dos ambientes que lhes cuidam. O equilíbrio da proteção e do cuidado é da ordem que não sufoque e não restrinja o amplo amadurecimento e permita um viver criativo. O caminho se faz caminhando...
FONTE: Trecho retirado do artigo Desenvolvimento Infanto-Juvenil e os Desafios da Realidade Contemporânea. CEREZER; Cleon S. 2009.
Nenhum comentário:
Postar um comentário